sexta-feira, 27 de abril de 2012





foi num dia desses
que a três meses
eu não à via,
que ela veio pela via
e parou na minha
cara a cara.

saquei que ela
já bem sabia
o meu horário
e meu itinerário
que passa a porta
de um motel.

não sei se chamava roma
não sei se chamava paris
mas foi onde aquela santa
me levou próximo ao céu,
para me fazer feliz.

os mais fortes fluidos
trocados naquele período,
foi um ótimo cataplasma
na pergunta fantasma
que assombrava
o meu trimestre:
porque ela não vinha
se tinha sido tão bom
também nas outras vezes?
três meses
por quatro horas...
ora bolas!

de uma mulher dessa
não se puxa conversa.
ela é uma daiana,
que caça minha carcaça
nas ruas por onde passa.
uma deusa patcha mama,
soberana em me tirar
a contrariedade 
da cidade.

é a alma invisível da rua
que contempla-me nua
na surpresa
de uma esquina.

anjo-mulher-menina;
sou sua presa
na cidade estricnina.



segunda-feira, 23 de abril de 2012





carrego no corpo e na alma
o que jamais alcançarei.
em um gosto que provei,
em um perfume que sorvi,
o passado jorra palpável
e altamente audível
alterando o pouco que sei.
o espírito menino
habita o corpo velho.
a minha mulher infância
fuma comigo em fumaças
que sugerem antigas figuras.
 há o homem,
mas há o poeta.
eles nascem e morrem
em certas partes de mim.
as sombras deles
ficam na estrada.



quinta-feira, 19 de abril de 2012

A PELEJA NO FREAKSHOW
D´AONDE O MIGUEL SE ORIGINOU





já vem O Augusto inventar
mais uma de suas histórias.
se escrevo é só pela farra.
não quero fama, nem glória.
só quero quem queira escutar
a minha mais douda oratória.

todo mundo sabe que eu
sou um bom cabra da peste.
e sempre me dou muito bem
quando eu estou no nordeste.
mas foi lá paras bandas de riba
que quase não passo num teste.

foi numa quarta feira
e era noite de são brás.
andava só na madrugada
e no poste eu vi um cartaz:
'o circo esta na cidade
com seres fenomenais!'

e eu gosto tanto de circo,
que logo pensei: 'que sarro!'
mas o cartaz também avisava
que o show era um tanto bizarro...
diziam que antes do fim,
medrosos 'puxavam o carro'.

não me intimidei com o aviso
pois cabra sem medo eu sou.
'se for até uns três contos,
hoje mesmo lá eu vou.'
peguei o cartaz e sai
procurando o freakshow.

eu andei por mais de hora
sem ver uma alma penada.
foi quando, como milagre,
surgiu na curva da estrada
o circo com sua lona
totalmente iluminada.

cheguei na bilheteria
e perguntei: 'quanto é?'
o bilheteiro respondeu:
'paga o quanto que quiser.'
o cabra era metade homem
e a outra metade mulher.

dei então quinze centavos
e lembrei das casas bahia.
ele(?) me deu a entrada
me olhando com antipatia.
eu dei um tchauzinho pr´aquilo
sorrindo com muita ironia.

no corredor da entrada
eu fiquei impressionado
com um homem que estava
em um canto acocorado.
ele media dois metros!
assim mesmo, agachado.

localizar a poltrona 
não foi grade desafio.
dava pra ver a meia-luz
que o lugar tava vazio.
mas quando tudo clariô,
senti um grande arrepio.

no meio do picadeiro
tinha um monte de esquisito.
um homem igual caveira,
um com cara de cabrito,
um outro com quatro braço...
eu quase que solto um grito!

era uma cena dantesca.
tinha bem uns trinta e três.
palavra que descreva aquilo
não existe em português.
pensei que tinha morrido,
e tinha descido de vez...

um anão se destacou
no meio daquele escarcéu,
estendeu a mão e falou:
'prazer. meu nome é miguel."
meu queixo foi no joelho
e pensei: 'meu deus do céu!'

pro circo ele foi vendido
por um tio que tanto gostava.
perguntei se era estudado.
respondeu: 'eu fiz a oitava.
e veja como estou agora:
com os malucos, comendo fava...

e se você esta aqui,
maluco você também é!
venha! se junte a nós!
você pode ser o pajé...'
eu pensei com meus botão:
'vou mesmo é dá no pé!'

mas todo mundo bem sabe
que eu também sou esquisito.
e eu logo me afeiçoei
ao pequeno miguelito.
e disse assim pra ele:
'vamu prum circo bunito!'

olhei para o naniquinho
e falei assim: 'ô miguel;
cê sabe fazer o que?'
'eu sei bem ler um cordel'
peguei o bichinho no colo
e corri que nem um corcel.

hoje vocês podem ver
lá mesmo na cooperifa,
esse monstro abençoado
sem nem me pagar tarifa.
e quem falar mal do miguel
prometo que meto a bifa.

e foi assim que apareceu
essa estranha criatura
que sempre vem nos trazer
graça, simpatia e cultura.
narrou o poeta fuleiro
mais uma louca aventura.



quarta-feira, 18 de abril de 2012

INSIGHTS
(ou as filhas do pastor)






elas eram célia e circe. irmãs nascidas na diferença de três minutos. pela proximidade, cresceram juntas em afinidades, pois além de irmãs eram melhores amigas. ficavam horas absortas  em brincadeiras que faziam apenas com papel e caneta. célia e circe estavam sempre administrando um escritório, um restaurante ou uma floricultura onde elas eram chefia, produção e clientela. a brincadeira sempre acabava bem com as duas se refestelando com o produto final. e riam. riam. não tinham bonecas, panelas, bambolês ou lápis de cor. não gostavam. de escola também não brincavam. na escola eram séria e melhores alunas em todas as matérias e  anos. tinham a antipatia dos coleguinhas, porem, elas em si se bastavam
o pai dessas meninas era um pastor profissional. adão era graduado em psicologia, pós-graduado em comportamento humano e doutorado em mentalismo. tudo na rua. muito cedo ele percebera o poder da palavra observando o homem da cobra na praça da sé. seu pai, o avô das meninas, era o cara que nunca pulava pelo circulo de facas, mas vendia por cinco cruzeiros centenas de latinhas com óleo de figado de peixe elétrico que ele mesmo preparava em casa. e nessas observações, adão um dia  viu um jovem edir macedo proferindo palavras enérgicas sobre um pequeno circulo que o rodeava. foi lá ver. o cara era bom. falava de deus e no fim do falatório, convocou as pessoas a darem dez por cento do que tinham ali no bolso. e algumas deram mesmo. ele foi um dos que não deram, talvez por nada ter naquela hora. mas ficou impressionado. tanto que trinta anos depois, tinha a sua própria igreja e prestava consultoria à novos empreendedores dispostos a entrar no lucrativo ramo da fé.
se na escola torciam o nariz para célia e circe, nas congregações aonde acompanhavam o pai, eram solicitadas e invejadas. templos ficavam lotados aonde o pastor adão aparecia. ele tinha a manha de curar doenças e resolver qualquer problema nos breves intervalos de sua santa palavra proferida qual metralhadora. crianças não gostam de verborragia.  elas ficavam geralmente pelas calçadas ou por algum páteo interno, brincando muito e falando baixo. célia e circe, como novidades, sempre comandavam essas brincadeiras. advinha de que? só que ali elas eram sempre as clientes. vai vendo...
certa feita em goiania, dois meninos passaram a se xingar para ter atenção das gêmeas. entre lágrimas, um deles grudou no pescoço do outro e chegou a desferir alguns golpes no subjugado antes que um adulto ali mais próximo separasse a contenda. as meninas se entreolharam e assim que o adulto se afastou, circe disse para eles: 'minha irmã brinca com quem ganhar o duelo entre vocês.' toparam. um menino dali falou: 'eu aposto que o leandro ganha.' uma outra discordou: 'mas o leonardo já bateu nele...' o menino triplicou: 'aposto no leandro!' e deu-se. num canto livre de adultos, célia e circe organizaram a primeira rinha de criança. as regras foram aprimoradas. ninguém se feria. meninos dispostos a brincar, não faltavam. até meninas. as irmãs ganhavam nas inscrições e em parte das apostas. quase sempre um dízimo.
uma certa noite, eu vi uma dessas apresentações na janela do meu apartamento da gávea, que ficava um inferno em dias de culto. saquei tudo na hora. eliminei todas as regras da brincadeira das meninas, me mudei pra bangcoc e também fiquei milionário.

domingo, 15 de abril de 2012



fez-se una 
todas elas.
una nas mazelas
e nas mais belas
conquistas.

santas putas artistas
ativistas em tantas lutas
fazendo sopa
cozendo roupa
beijando boca.

estão em todas as vidas
divididas em três
que por sua vez,
é una.

é mãe é esposa é filha
é fortuna que brilha
na pura concepção.


é feminina a natureza.
a morte a sorte a certeza
no poder da criação

da tino
ao moto 
continuo

põe tudo adiante.
diante do destino
que tanto se repete
no que se remete
à essas três
em una tez.

elas são assim.
começo, meio e fim.
estão muito além de mim
ou de quem quer que seja.

tá no pão. tá na cerveja.
na loucura e na inspiração.
na lida dura, na diversão.
no gozo gostoso
e na hora da aflição.

sólida e ilógica.
realmente mágica.
três em una.
leve qual pluma
da asa do vento.
nelas, rebento
em talvez:
é una.
é três.

segunda-feira, 2 de abril de 2012








ousadia seria
se um dia
eu falasse
a poesia
qu´eu te fiz no motel..

não sei se seria engraçado,
não sei se seria cruel,
pois quem estivesse ligado
veria logo os detalhes
ali recitados.

você ficaria vermelha
igual a telha
que tampa os ares
do nosso desejo.
desejo que se assemelha
a desatino.

vejo que ler a poesia
seria tirar o pino
daquela granada
travada.
faço isso nada!

deflagrada a revelação
talvez seria ruim.
talvez por retaliação
você não desse mais pra mim.