sábado, 25 de dezembro de 2010

é vinte e cinco de dezembro
e eu, tristemente, me lembro
dos adoentados
dos presos 
e dos abrigos lotados.
papai do céu, papai noel
foram para o beleléu.
filho, me da um beijo!
pai, me passa o copo!
de todos os meus desejos
são esses que agora eu topo



quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

sábado e domingo passado estive no rio de janeiro com a primeira caravana de poesia organizado pelo alessando buzzo da suburbano convicto e pelo fernando do sarau da vila fundão.
desse bonde também participou o povo do elo da corrente, do sarau da brasa, do binho, os poetas do tiête e de outros coletivos literários das periferias de são paulo.
já morei no rio de janeiro e de lá eu tenho as melhores lembranças e impressões.
carioca é gente boa, sim. filho da puta tem em todo lugar. rixa mais boba...
as penúltimas noticias que chegaram de lá através da imprensa para mim, dão conta de que o rio de janairo, agora sim, está lindo. se essa beleza se refere à algum tipo de erradicação da violência na dita cidade maravilhosa, a imprensa mentiu de novo.
cito aqui dois extremos que ilustram como o rio de janeiro continua lindo e dividido:
na tarde de sábado estivemos na grota, comunidade que faz parte do complexo do alemão. era dia de festa.
fora os poetas que se apresentariam naquela tarde, teriam outras atividades artísticas e sociais acontecendo abaixo daqueles teleféricos. grafiteiros tomavam as ruas ao redor do palco. crianças riam e corriam. a duzentos metros, na avenida principal, o exercito ostentava tanques e armas pesadíssimas.
tipo sarajevo mesmo. tensão no ar. estavamos ali de visita, não tinha por que abordar. mas conversando com os locais, eles disseram que o morro não esta tão 'pacificado' assim. abusos ainda acontecem.
feita a apresentação na grota, seguimos para o morro do fallet, no centro do rio de janeiro.
não sei porque cargas d´agua, descemos por um caminho diferente de um pessoal que saiu andando logo que o ônibus parou. eu, fernando, pézão, camila e outras pessoas que agora não lembro, dado o meu estado etílico, descemos escadas longínquas até chegar em um largo no coração do morro onde aconteceria as apresentações. 
logo vi a uns oitenta metros um grupo onde um individuo saracoteava uma arma do tamanho de uma picareta. não sei identificar nem carros e nem armas. sei lá que porra era aquela.
a boca miúda, logo nos chegou a informação que não era para tirar fotos. teve gente que tirou. eu mesmo tirei umas com um palhaçinho que por lá se divertia. 
ali também tinha abusos.
dado esses acontecimentos, fui tomado por uma dúvida: 'até que ponto precisamos que as intituições cuidem de nós? até o quando o povo vai viver instituído?' sai de lá sem resposta
no mais; pelos lugares que passamos (ramos, nova iguaçu, borel), fomos muito bem acolhidos e tratados.
as pessoas se identificavam automaticamente com a gente ao saber o motivo da nossa visita ali: ler poesias! 
elas se encantavam e contavam histórias da comunidade relativas a essa elegia. algumas até arriscaram os primeiros versos. 
a magia das palavras sempre vão tocar as pessoas. de um modo ou de outro.
aproveito a deixa para me desculpar com as pessoas que se sentiram perturbadas pelo meu comportamento dionisíaco. naquele fim de semana, especificamente, eu não tinha tomado os meus remédios, já sabendo das cervejas que tomaria.kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
escusas escusas. escusas.
para a maioria (mais de quarenta) que se divertiu levando poesia, música e alegria para essas comunidades tão pejorativamente retratada, fica o meu respeito e admiração, assim como ao povo que ficou lá e, com certeza, pelo menos um vai usar o conhecimento, a força da palavra para mudar algo ao seu redor.
e essa é a mensagem que eu deixo nesse ultimo post do ano: se não conseguimos mudar as coisas, mudemos nós. 
já quintana diria: 'cuide do jardim, as borboletas virão.'
estou indo pra casa de mãinha com meus filinhos e de lá não saio tão cedo. talvez o ano que vem...
para todos: A GLÓRIA!



estamos aqui no tablado,
feito de ouro e prata
e filó de nylon!


eles querem salvar 
as glórias nacionais.
as glórias nacionais!
coitados...




ninguém me salva.
ninguém me engana.
eu sou alegre,
eu sou contente,
eu sou cigana.

eu sou terrível.
eu sou o samba.
a voz do morto,
os pés do torto,
o cais do porto,
a vez do louco,
a paz do mundo:
Na Glória!


eu canto com o mundo que roda.
eu e o paulinho da viola
viva o paulinho da viola!


eu canto com o mundo que roda
mesmo do lado de fora,
mesmo que eu não cante agora.



ninguém me atende,
ninguém me chama.
mas ninguém me prende;
ninguém me engana!


eu sou valente.
eu sou o samba.
a voz do morto
atrás do muro.
a vez de tudo
e a paz do mundo
na Glória!



CAETANO VELOSO



sexta-feira, 17 de dezembro de 2010






foi coagido por um trinta e oito que eu entrei naquele bar.
não que o referido ambiente seja à mim desprezível. eu até estava esperando o ônibus para ir no zé batidão, mas quis o destino que eu estivesse na hora errada e no lugar errado.
garoava. a rua estava vazia. sentei nos degraus da entrada de uma loja e ali fiquei lendo, protegido pelo toldo.
levantava a vista somente para ver os ônibus que não me serviam passarem molhados e de janelas fechadas.
o chácara santana, nada.
entretido estava com o 'não verás país nenhum' quando fui puxado pela manga do casaco. 
de primeira, pensei ser dodô, nêgo véio que sempre se aproxima de mim sorrateiramente para me aplicar um susto e dar a sua famosa gargalhada.
mas logo que, vesgo, vi o cano do trinta e oito encostado na ponta do meu nariz tive certeza que era outra coisa.
'que porra é essa, meu velho?' perguntei abrindo os braços. 
'cala a boca, caralho! levanta. levanta.' me disse aquele estranho, tornando a me agarrar pelo casaco. 
pensei : 'pronto! acabou. vão sentar o dedo no véio. será ele pé de pato ou marido traido?'
sem resposta para a minha breve lucubração. fui conduzido ao bar do edson que fica a uns seis metros na mesma calçada do ponto onde eu estava.
quando vi o edson em pé fora do balcão, e quatro barflys que estavam por ali rendidos por mais dois caras de pistola na mão, até relaxei. pensei: 'ufa. é só um assalto...'
a porta de aço foi abaixada para os meninos trabalharem com mais desenvoltura.
'a gente vai levar o que der. quem levar uma vai tomar pipoco, entedeu? nóis não tá aqui de brincadeira não, caraio! fika de cabeça baixa e mãozinha pra frente ai. todo mundo, porra!'
ai foi akilo: carteira e celular de todo mundo, todos os maços de cigarro, isqueiros, super bonder, garrafas de bebidas. peças de carne. limpeza geral.
eu mesmo não tinha nada de substancial. sete paus na carteira, identidade já providenciada, bilhete único... 
fui mais testemunha do que assaltado.
'já pegou a grana do bar ai, negão?
'ainda não, negão. tô fazendo o recolhe das carne aki.'
'ô negão, pega o pintoso ali pra conferir a féria.'
de cabeça baixa, percebi que o edson saiu do lugar aonde ele estava em posição de estátua.
'só isso, caraio? aê negão, esse filho da puta tá de brincadeira comigo! ó o dinheiro que ele quer dar pra nóis, ó. ó. tá fudido, viado. pega logo o resto, caraio!'
ai meu estômago embrulhou. tentei rezar. sem chance. só via a carinha do davi e da ágata se acabando de dar risada. não sei porque pensei: 'não quero ouvir nenhum barulho agora.'
'pô cara. é só isso mesmo o que tem. você até viu que eu tirei dinheiro que nem tava no caixa. choveu o dia inteiro. foi muito devagar mesmo.' desculpou-se o edson. é de fuder!
'pega essa porra ai mesmo e vamu saí fora, negão. aqui já tá dominado, já.'
ufa de novo.
às minhas costas ouvi perguntar: 'de quem é essa mochila?'
'é minha.' respondi.
'o que é que tem aqui dentro dela?'
'livros.'
'vou esvaziar ela pra poder carregar as coisas do bar, tudo bem?'
tudo bem? tudo bem? 'vai tomá no cú!' pensei com meus botões. não respondi nada.
'todo mundo de cabeça encostada na parede ai que a gente vai sair fora. se abrir a porta na sequencia vai levar bala. pode ficar ai quietinhos por um tempo.'
ouvimos a porta abrir e fechar. nos viramos automaticamente. todos com cara de bosta.
impotentes. envergonhados. falávamos por sussurros. o bar estava uma zona só. coisas jogadas pelo chão. 
um dos caras disse: 'abre essa porta que eu tô ficando nervoso, caraio!'
ai eu ri. já se tinham passado uns três minutos. um bom tempo pra quem quer fugir.
levantaram a porta de aço e tinha um chácara santana me esperando bem ali. à uns seis metros fora do ponto. ri de novo.
'ô motorista, dá uma carona pra mim. acabei de ser assaltado aqui nesse bar.'
o motorista abriu a porta de trás, eu subi e ele ficou uns segundos conversando com o edson na porta da frente. conheciam-se. 
encontrei a linda elisandra dentro do busão e comecei a contar a história. 'levaram minha identidade, mas deixaram um loyola brandão e um lápís sem ponta.' ela riu e disse: 'já tô vendo um conto dessa história...'
isso foi o que aconteceu.
o conto vem já-já.







segunda-feira, 13 de dezembro de 2010





LA DOLCE VITA





pelo vidro do carro onde eu agonizava, divisei uma mulher estonteante, gostosa mesmo, prestes a atravessar a rua.
foi ai que eu relaxei e tive a certeza que aquela minha quase morte não seria consumada.



domingo, 12 de dezembro de 2010









pra defender a merenda
aceitei fazer poesia
por encomenda.

o bom censo
não recomenda
que a poesia
seja a emenda
que sirva de ponte
sobre a fenda
que liga a barriga
na merenda.
fazer o que?
preciso de renda.

barriga vazia
tem nem poesia.





ABANDONO





aponto meu lápis no asfalto
e no ato escrevo o que falta.
a minha letra esta brava!
o meus escrito não é bonito.
e desacredito que faça sentido
pra alguém, fora eu.

essa letra mesmo nasceu
apertada em um busão.
com fome e sem um tostão.
só me restou escreve-la...
'e dá para encher a barriga?'
eu lhe digo, gente amiga:

enche, sim, a barriga
desses reis da intriga
que dão um novo formato
ao velho capitão do mato;
a matéria esta no laço
e o artista no estrelato.

querem globo.
querem folha.
e não mais andar à sapato.
querem carro caro
e não depender de salário.

tá errado?
eu mesmo acho que não.
eu só acho que a arte
não deve de ter patrão.
isso influi na produção
e a deixa tendenciosa.

fica igual à essa joça
que eu fiz passando perreio.
poesia;
pra que é que tu veio?
não sabe que eu entristeço
ao ver que até a rua
tem um preço?
eu acho isso tão feio...





sábado, 4 de dezembro de 2010















caros queridos;
quinta feira a noite estive no jardim monte alegre, participando do sarau do elo da corrente. 
confesso que nesses anos de frequentador de saraus, nunca participei de um tão emocionante. quando chegou a noticia que o bar do santista tinha sido lacrado , fiquei injuriado por ver a prefeitura agindo arbitrariamente mais uma vez. se o bar não tem um alvará de funcionamento, tenho certeza que não é por sacanagem ou preguiça do santista. os tramites para receber tal documento passam por longos caminhos burocráticos e taxas abusivas. ninguém quer pagar para trabalhar. ai, vai o pobre do fiscal desavisado e põe um papel véio lá na porta do bar, embargando o bang.
mas meu povo é de luta. quando chegou a convocação pro sarau-protesto, não teve como eu me esquivar. nunca tinha ido no sarau do elo. em tempo: toda quarta é de lei eu estar na cooperifa. é no quintal da minha casa. tropeço bêbado no alto da ladeira e já caio de banho tomado na minha cama. na noite seguinte, o véio geralmente tá de rê bordosa ou então, colo na fundão, que é beeem mais perto de casa. disse à mim mesmo: "vou, vou e vou!" e fui. noite mágica. o sarau rolou a poucos metros do bar do santista, na futura garagem do tio do michel (quando for bater a lagem, é nóis!).só gente boa de vários coletivos.
a brasa tava lá, quilombaque, as belas d´ademar, e de tantos outros cantos. apesar de estarmos com uma bucha na mão, o que eu vi ali foi a celebração da amizade e da fé num futuro onde o respeito predomine, um futuro permeado de música, poesia, igualdade e trabalho funcional onde o retorno é garantido. 
respeito. muito respeito encontrei de baixo daquela lona. a chuva, que não foi convidada, veio somar. foi uma grande correria para acomoda-la, mas logo ela se enturmou com o meu povo e as meninas foram lá dançar com ela. eu fiquei só admirando a agua que vinha lavar nossas almas. os tambores gritaram alto. akins puxou o sambão.  e eu, sentei em baixo de um pé de arvore do outro lado da rua e fiz essa rima cotó para ilustrar o que eu fui fazer lá. o amor estava no ar. eu voltei apaixonado. 
pelo sarau do elo da corrente, pelo meu povo, pela vida e por uma mulher. noite mágica...




se o bar do santista tá fechado,
nóis não fica atarantado;
faz sarau do outro lado lado.

o que não pode fechar
é o canal com a poesia,
que gera forte energia
para o tambor e pra flor.

a palavra não será calada!
pode lacrar.
pode latir.
a palavra da perifa
vai se sobressair.

gente igual a raquel,
igual ao michel,
não deixará 
a cultura ao léu.

e a gente aqui presente,
cada elo dessa corrente,
estaremos sempre com eles
buscando a vida coerente.



P.S.  O bar do santista já tá liberado. oxalá!









quarta-feira, 1 de dezembro de 2010















venho ventando
vontade desconexa
hora mais perplexa
que perco pensando
no que devo fazer

idéia imatura brota
no meio da flor da pele
e o que ela me sugere
traz revolta e derrota
para dentro do meu ser

por eu morar na favela
e não ter um automóvel,
sou tido como ignóbil
por uma grande parcela
do seu parco entender

de longe ganhei a cena
e digo: "parei contigo!"
prefiro ser um mendigo
com a alma  ádvena
do que ser igual a você