sexta-feira, 17 de dezembro de 2010






foi coagido por um trinta e oito que eu entrei naquele bar.
não que o referido ambiente seja à mim desprezível. eu até estava esperando o ônibus para ir no zé batidão, mas quis o destino que eu estivesse na hora errada e no lugar errado.
garoava. a rua estava vazia. sentei nos degraus da entrada de uma loja e ali fiquei lendo, protegido pelo toldo.
levantava a vista somente para ver os ônibus que não me serviam passarem molhados e de janelas fechadas.
o chácara santana, nada.
entretido estava com o 'não verás país nenhum' quando fui puxado pela manga do casaco. 
de primeira, pensei ser dodô, nêgo véio que sempre se aproxima de mim sorrateiramente para me aplicar um susto e dar a sua famosa gargalhada.
mas logo que, vesgo, vi o cano do trinta e oito encostado na ponta do meu nariz tive certeza que era outra coisa.
'que porra é essa, meu velho?' perguntei abrindo os braços. 
'cala a boca, caralho! levanta. levanta.' me disse aquele estranho, tornando a me agarrar pelo casaco. 
pensei : 'pronto! acabou. vão sentar o dedo no véio. será ele pé de pato ou marido traido?'
sem resposta para a minha breve lucubração. fui conduzido ao bar do edson que fica a uns seis metros na mesma calçada do ponto onde eu estava.
quando vi o edson em pé fora do balcão, e quatro barflys que estavam por ali rendidos por mais dois caras de pistola na mão, até relaxei. pensei: 'ufa. é só um assalto...'
a porta de aço foi abaixada para os meninos trabalharem com mais desenvoltura.
'a gente vai levar o que der. quem levar uma vai tomar pipoco, entedeu? nóis não tá aqui de brincadeira não, caraio! fika de cabeça baixa e mãozinha pra frente ai. todo mundo, porra!'
ai foi akilo: carteira e celular de todo mundo, todos os maços de cigarro, isqueiros, super bonder, garrafas de bebidas. peças de carne. limpeza geral.
eu mesmo não tinha nada de substancial. sete paus na carteira, identidade já providenciada, bilhete único... 
fui mais testemunha do que assaltado.
'já pegou a grana do bar ai, negão?
'ainda não, negão. tô fazendo o recolhe das carne aki.'
'ô negão, pega o pintoso ali pra conferir a féria.'
de cabeça baixa, percebi que o edson saiu do lugar aonde ele estava em posição de estátua.
'só isso, caraio? aê negão, esse filho da puta tá de brincadeira comigo! ó o dinheiro que ele quer dar pra nóis, ó. ó. tá fudido, viado. pega logo o resto, caraio!'
ai meu estômago embrulhou. tentei rezar. sem chance. só via a carinha do davi e da ágata se acabando de dar risada. não sei porque pensei: 'não quero ouvir nenhum barulho agora.'
'pô cara. é só isso mesmo o que tem. você até viu que eu tirei dinheiro que nem tava no caixa. choveu o dia inteiro. foi muito devagar mesmo.' desculpou-se o edson. é de fuder!
'pega essa porra ai mesmo e vamu saí fora, negão. aqui já tá dominado, já.'
ufa de novo.
às minhas costas ouvi perguntar: 'de quem é essa mochila?'
'é minha.' respondi.
'o que é que tem aqui dentro dela?'
'livros.'
'vou esvaziar ela pra poder carregar as coisas do bar, tudo bem?'
tudo bem? tudo bem? 'vai tomá no cú!' pensei com meus botões. não respondi nada.
'todo mundo de cabeça encostada na parede ai que a gente vai sair fora. se abrir a porta na sequencia vai levar bala. pode ficar ai quietinhos por um tempo.'
ouvimos a porta abrir e fechar. nos viramos automaticamente. todos com cara de bosta.
impotentes. envergonhados. falávamos por sussurros. o bar estava uma zona só. coisas jogadas pelo chão. 
um dos caras disse: 'abre essa porta que eu tô ficando nervoso, caraio!'
ai eu ri. já se tinham passado uns três minutos. um bom tempo pra quem quer fugir.
levantaram a porta de aço e tinha um chácara santana me esperando bem ali. à uns seis metros fora do ponto. ri de novo.
'ô motorista, dá uma carona pra mim. acabei de ser assaltado aqui nesse bar.'
o motorista abriu a porta de trás, eu subi e ele ficou uns segundos conversando com o edson na porta da frente. conheciam-se. 
encontrei a linda elisandra dentro do busão e comecei a contar a história. 'levaram minha identidade, mas deixaram um loyola brandão e um lápís sem ponta.' ela riu e disse: 'já tô vendo um conto dessa história...'
isso foi o que aconteceu.
o conto vem já-já.







3 comentários:

  1. Porra que legal, da hora mano!
    mais testemunha do que assaltado, muito boa...

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  2. devia ter pedido esmola pro negão.
    "poxa, deixa uma garrafinha só... uma dose!"

    rsrs
    muito bom, Augusto!

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  3. Contos da vida real,mas não precisa acontecer com o autor, né?Que fosse ficção, pô!

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muito obrigado por comentar neste blog. só não esqueça que a trema caiu e que berinjela é com J! não leve a mal. estou avisando para que você não passe vergonha na frente dos outros comentaristas.